
O Brasil vive um paradoxo no setor de tecnologia: enquanto o mercado cresce a passos largos, a retenção de talentos se torna um dos maiores desafios enfrentados pelas empresas
Segundo dados da IDC, o setor de Tecnologia da Informação (TI) no país deve crescer 13% em 2025, superando, inclusive, os Estados Unidos e a média da América Latina. No entanto, esse avanço esbarra em um problema estrutural: a alta rotatividade de profissionais, que chega a uma média de 20% a 30% ao ano, com picos superiores em startups e empresas de software.
A escassez de mão de obra qualificada agrava o cenário. De acordo com a Brasscom, o Brasil forma cerca de 53 mil profissionais de tecnologia por ano, enquanto a demanda até o final de 2025 deve ultrapassar 800 mil vagas, gerando um déficit de aproximadamente 530 mil pessoas. Essa lacuna tem provocado uma verdadeira corrida por talentos, com empresas disputando profissionais em áreas como segurança cibernética, ciência de dados e engenharia de software.
A rotatividade elevada tem múltiplas causas. Muitos profissionais deixam seus cargos por falta de plano de carreira, jornadas exaustivas, remuneração abaixo da média internacional e culturas organizacionais pouco acolhedoras. Além disso, o assédio de recrutadores estrangeiros e a oferta de trabalho remoto internacional têm seduzido desenvolvedores brasileiros, que buscam melhores condições e salários em dólar.
Priscila Oliveira, Head de Cultura e Pessoas da Kstack, diz que na mudança no modelo de trabalho, muitos profissionais experimentaram o trabalho remoto durante a pandemia e hoje buscam manter essa flexibilidade. “Quando empresas exigem retorno ao presencial, surge um desalinhamento entre a expectativa do colaborador e a proposta da empresa. Profissionais de tecnologia em especial acreditam que não precisam estar na empresa para entrega de bons projetos”. A executiva ainda explica que há a atração internacional, “uma abertura de oportunidades remotas em empresas estrangeiras que oferecem salários mais competitivos em dólar ou euro, o que aumenta a saída de talentos do mercado nacional”.
Da mesma maneira, a executiva afirma que há a rapidez de desenvolvimento tech, em que os profissionais de tecnologia buscam projetos inovadores com tecnologias novas, que estão em constante movimento. “Na Kstack, por exemplo, sentimos isso de perto. Muitos candidatos e até profissionais alocados relatam que o fator modelo de trabalho (presencial versus remoto) pesa muito na sua decisão, e com o mercado internacional aquecido com propostas de maior flexibilidade e remuneração”.
O impacto da rotatividade vai além dos números. A saída frequente de talentos compromete a continuidade de projetos, afeta a qualidade das entregas e eleva os custos com recrutamento e treinamento. Estima-se que substituir um desenvolvedor sênior possa custar até R$120 mil, considerando perdas operacionais e tempo de adaptação.
Oliveira afirma que na Kstack, cultura é o principal diferencial competitivo. “Na Kstack, trabalhamos em duas frentes:
- Proximidade com os colaboradores: mesmo em contratos de hunting e alocação, buscamos manter contato constante para entender como está a experiência deles no cliente;
- Flexibilidade e adaptação: sabemos que o modelo de trabalho é um ponto sensível, então apoiamos os clientes a pensar em formatos híbridos ou mais flexíveis e sempre que possível, para alinhar às expectativas do mercado principalmente em relação a valores e desafios dentro dos projetos.
De acordo com especialistas, a chave está em uma cultura organizacional voltada à inovação, desenvolvimento de talentos e valorização do capital humano. A executiva diz que acredita que existe, sim, uma mudança geracional, “os profissionais mais jovens não enxergam a carreira como algo linear e valorizam propósito, qualidade de vida e flexibilidade tanto quanto remuneração”. Mas reitera dizendo que existem muitas empresas que ainda enfrentam falhas estruturais, “como a falta de planos de carreira claros, liderança pouco preparada para lidar com equipes remotas, e benefícios e salários que não acompanham o mercado; quando esses pontos se encontram, uma geração com expectativas mais altas e organizações que ainda não se adaptaram totalmente, a rotatividade acaba sendo inevitável”, finaliza a executiva.
Lívia Ikeda Martins 14998093659 [email protected]